
Há muito tempo venho com o desejo de escrever sobre o
Theatro Municipal. Mais do que um lugar onde foram (e serão) realizados extraordinários espetáculos, foi (e será) palco de grande parte da minha formação musical/cultural/pessoal. Eis que conversando com a minha tia - que além de guia de turismo é uma apaixonada por tudo que se relaciona a música clássica e o que ainda permanece de belo na nossa cidade - ela vem me contar sobre uma
visita guiada que realizou recentemente, então pensei: abrirei o espaço para que ela possa trazer nas suas palavras, o significado (único e singular) de sua visita e tudo que despertou a partir desta. Segue o sensível - e porque não informativo- texto, que traduz muito do meu sentimento:
“Para os apaixonados pelo Theatro Municipal do Rio de Janeiro, ou ainda, para aqueles que nunca lá assistiram a um espetáculo, o grande programa da Cidade é fazer a visita guiada às obras de sua recuperação, no centenário de sua inauguração, desse que é, para mim, a extensão da minha casa.
Como boa carioca que sou, apaixonada pelo Rio, guia de turismo e por isso, anfitriã de minha cidade, logo que soube dessa possibilidade agendei correndo e fui, na ultima sexta-feira, na companhia de um amigo.
A visita guiada começa no Anexo do Theatro, com um filme contando sua historia no cenário político do então prefeito Pereira Passos, conhecido como "o bota - abaixo". (Era o final do século XIX e o alcaide foi convidado a ir a Paris conhecer as obras de modernização que o Barão de Haussmann promovia na Cidade-Luz para, com o início da Republica aqui instalada, poder tornar o Rio uma metrópole com ares europeus, mais condizentes com sua situação de capital do País).
Em seguida, através de vários painéis, conhecemos detalhes da arquitetura, dos personagens envolvidos na construção, na maneira - muito atual - de promover um concurso e o vencedor ser o filho do prefeito, saber que o Pano de Boca foi pintado por Eliseu Visconti, em Paris, dado que não havia na cidade local que abrigasse tão grande painel, entre outras informações prá lá de deliciosas que eu desconhecia...
Finalmente, para mim, o grande momento chegava: entrar pelos fundos do Theatro, e segura no meu capacete de obras, subir as escadas que dão acesso ao fundo do palco.
Nesse momento, a lembrança e a emoção tomaram conta de mim... meu coração disparou e meus olhos se encheram de lágrimas, revivendo os 50 anos que frequento o lugar...
Eu ouvia as vozes de meus pais, que cantavam no Coro do Eliezer Steinbarg e anualmente se apresentavam com a OSB... os instrumentos serem afinados... os risos dos músicos... os concertos com inúmeras orquestras brasileiras e internacionais... os maestros Morelembaum, Karabtchevsky, Kurt Masur, o Hino Nacional sendo tocado nas estréias das temporadas, enfim... sentia no ar o frisson de mais uma récita memorável...
Isso sem falar dos balés, da menininha que eu era e queria ver de perto Jacques Klein tocando a Fantasia para Piano e Orquestra de Beethoven e se entristecer por achar que, sentando no camarote do lado direito do teatro onde estava o piano na primeira parte do concerto e em seguida colocado no centro do palco para a apresentação do pianista, não conseguir acompanhar as mãos do grande artista... que decepção...
Lição aprendida, toda vez que um pianista se apresenta, o melhor lugar é sentar no lado impar das poltronas...
Ainda menina, ficar tão empolgada com as musicas, sair cantando e se estatelar nas escadas do balcão nobre...
E levar minhas filhas, pequenas ainda, aos ensaios de sábado de manhã, para que elas conhecessem os instrumentos da OSB, conversar com os músicos, ensinar essa que, para mim, é a melhor forma de meditação que conheço... entrar em contato com algo divino, que dissipa tristezas e renova as esperanças...
Quantas vivencias...
Durante muitos anos fomos assinantes da OSB, OPES, e assistíamos a todos os concertos internacionais. Numa dessas temporadas, enfrentamos um tour de force das nove sinfonias de Beethoven (olha ele aí de novo...), em quatro noites com a Filarmônica de Nova York, (se não me falha a memória) conduzida por um Kurt Masur "endiabrado". No dia seguinte, era a apresentação da OSB e papai, brincando, comentou naquele seu jeito inesquecível: "Comí tanto faisão e agora voltei ao frango..."
E os incontáveis balés, as palmas das crianças, aquela algazarra de felicidade e de sonho...
Hoje a sonoridade da OSB está entre as das grandes orquestras do mundo, sem sombra de dúvida...
Como é bom rever, a cada espetáculo, rostos tão conhecidos, acompanhando a passagem do tempo, vendo-os envelhecer (e eu também...) e saber que jovens talentos renovam as nossas orquestras...
Conhecer o "ar refrigerado" de 1909: dutos que saem por baixo das poltronas e, com ventiladores e gelo, a forma encontrada de refrigerar a réplica da Opéra Garnier de Paris nos trópicos... encantador...
Saber que as poltronas serão revestidas de veludo cor de rosa, que não haverá tapetes e sim corredeiras sobre o parquet, como originalmente... e a grande águia dourada...
Ai... quanta coisa...
Se eu contar tudo, parte da graça da visita se perderá... deixo para cada um sua experiência e sensação particulares...
Enfim... uma grande viagem no Tempo, uma saudade imensa de toda essa Historia pessoal vivida, e o presente e o futuro renovados dentro desse que é um marco na minha vida pessoal e, claro, da cidade também...”
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Liana Siag - guia de turismo e agente de viagens